Para Delvair Dolores Giacomini
Numa incerta e nublada manhã - seria agosto ou setembro? trinava um canário em algum galho, isso eu lembro,- seguia preocupado e de olho no relógio, a caminho da estação rodoviária, quando encontrei uma senhora que parecia ter saído de um livro ilustrado. Usava vestido longo e estampado, evocando a primavera. Suas unhas tinham a cor da flor da romã. Seus doces olhos douravam a esquiva manhã, e tudo numa calma impressionante. Não me contive. Perguntei:
-Como vai a Poesia?
Pra quê!
Sensíveis cordas distendidas pelo tempo
esperam apenas um leve sopro do momento...
A Poesia? Ela não deixou por menos... de meia hora. Emoções são intraduzíveis, e pequena é a memória... e mesmo que eu quisesse reproduzir a grandeza daquele momento, em que alguém enclausurado pela miopia do dia-a-dia de repente recebe um jorro de luzes... como descrever o instante em que se abrem as portas de um outro mundo, num piscar de olhos? Outro universo, outras magias e encantos...
30 minutos que eu não esqueço jamais. De início um tanto aflito, confesso. Mas depois, receptivo. Encantado.
Resultado: não só não perdi o ônibus (algo ou alguém o reteve pelo caminho), como ganhei uma amiga inseparável: a Poesia.
Tudo porque, numa incerta e nublada manhã perguntei, talvez não por perguntar, como vai a Poesia...
Giruá, 30/09/07.